quinta-feira, 17 de abril de 2014

Criminalidade - Violência no Brasil - A Impunidade é a Causa da Violência no Brasil



"A certeza de um castigo, mesmo moderado, causará sempre impressão mais intensa que o temor de outro mais severo, aliado à esperança de impunidade."  

Quem escreveu isso foi Cesare Beccaria, célebre jurista e filósofo italiano em "Dos Delitos e das Penas", obra estudada até hoje na área do Direito. 

Estudante de Direito, tenho feito estudos paralelos ao ministrado na faculdade buscando as causas da violência em meu país. Todos os dias reservo um tempo para ler as notícias e não é impressão minha. A criminalidade aumentou absurdamente nos últimos anos. Isto não tem relação com com minha frequência às notícias, basta verificar os índices e estudos sérios sobre o tema. 

Não concordo que a pobreza seja a causa da violência. Leia abaixo algumas informações que lhe ajudarão a fazer uma revisão de conceitos. 

Fatores que causam aumento da criminalidade e impunidade

20/10/07, 12:22

POBREZA X CRIME
por Cláudio da Silva Leiria,

Promotor de Justiça de Guaporé/RS
O velho dogma esquerdista – muito acatado no Brasil - de que o crime é, de forma determinística, produto direto da pobreza, é uma daquelas mistificações pseudo-intelectuais que não resiste a menor análise dos fatos.
Em primeiro lugar, os delitos sempre foram praticados por um percentual inexpressivo da população, ou seja, a esmagadora maioria, embora pobre, não pratica crimes.  Como bem disse um Senador há pouco, ‘a maioria esmagadora dos brasileiros é honesta; a maioria esmagadora das pessoas mais pobres é honesta.  Há pessoas que se estiolam no alcoolismo porque não querem roubar, perdem toda a sua esperança, mas não roubam; há pessoas que vão pedir esmola nas ruas e não roubam, são honestas”.
Em segundo, se a criminalidade fosse decorrência da pobreza, não se explicaria o fato de que pessoas abastadas também cometem crimes (delitos de ‘colarinho branco’).
Em terceiro, ‘o mapa da violência no Brasil’, estudo divulgado recentemente pela Organização dos Estados Ibero-americanos para Educação, Ciência e Cultura (OEI), demonstra que não existe correlação estatística entre pobreza e violência, ou seja, são falsas as afirmações do tipo ‘quanto mais pobreza, mais violência’. Nas regiões mais pobres do Brasil, como o Nordeste, onde faltam condições minimamente dignas de existência (comida, emprego, escola) há proporcionalmente menos violência quem em regiões mais prósperas.
De outro vértice, pululam exemplos por todo o mundo de decréscimo acentuado e rápido da violência sem que tenha ocorrido qualquer alteração econômica favorável aos mais pobres.   Nos Estados Unidos, a taxa de homicídios apresentou declínio de mais de 30% em um período pouco superior a 06 anos; é famosa a redução da taxa de crimes em Nova Iorque graças ao programa Tolerância Zero.  Na vizinha Colômbia, mais especificamente na capital, as medidas tomadas pelo poder público reduziram, em apenas 10 anos, a taxa de homicídios de 80 para 20 em cada 100.000 habitantes.
E para não ficar-se apenas no exemplo de outros países, mencione-se que no Brasil a cidade de Diadema em apenas 05 anos reduziu de 110 para 35 a taxa de homicídios para cada 100.000 habitantes.
Importante reprisar que nos países citados não houve nos períodos indicados qualquer alteração significativa  das condições econômicas, derrubando-se a tese de correlação absoluta entre crime e pobreza.
Como a ideologia ‘emburrece’, nossos doutrinadores e intelectuais de esquerda – que são maioria nos meios de comunicação e na academia -  preferem não ver que o aumento da criminalidade possui relação muito mais direta com outros fatores.  Por exemplo: estudos sérios demonstram que o aumento da criminalidade possui correlação específica com a desordem, que se inicia ao não se reprimirem os pequenos delitos.
Outro fator a causar aumento do número de crimes é a impunidade e a edição de leis penais benignas - o delinqüente normalmente faz uma ‘dupla aposta’: aposta que não vai ser preso, e se for preso aposta que não cumprirá a pena até o fim.  Há outros móveis para o ingresso no mundo do crime: maldade, hedonismo, ausência de valores morais e religiosos, etc.
                                                  Em suma, enquanto os doutrinadores brasileiros insistirem na visão monocular de que o crime é causado fundamentalmente pela pobreza, o país perderá tempo, deixando de pesquisar e atacar as reais causas do crime.
Fonte: JL



A impunidade no Brasil estimula a criminalidade
Por: Riselda Morais



A impunidade no Brasil não é a única, mas a mais importante causa do aumento da criminalidade no País.

Uma vez que os pequenos delitos não resultam em prisão e os crimes hediondos ficam impunes graças às brechas das leis que beneficiam os criminosos; uma vez que não temos prisão perpétua, nem pena de morte, mas temos prisão domiciliar para crimes por motivos torpes, não estaria nosso País estimulando a violência ao invés de combater?
Se tivéssemos um bem sucedido programa de combate ao crime, toda e qualquer violação da lei, desde os delitos mais leves aos mais graves seriam tratados com igual importância e ao invés de ficar impune teria uma pena com caráter punitivo, exemplificativo e pedagógico para inibir outras transgressões da lei e o aumento da criminalidade.


Não bastasse a enorme quantidade de recursos legais que provocam uma impunidade generalizada no País, entre eles o agravo de instrumento, agravo interno, agravo retido, apelação, embargo infringente, recurso extraordinário, recurso especial, embargo de divergência, ação rescisória, prescrição do crime, penas alternativas, a morosidade da justiça na qual um processo pode ficar parado por tempo indefinido, prisões em selas especiais, responder em liberdade, prisão domiciliar, auxílio reclusão... este é ainda pior, um indivíduo comete um crime hediondo e ainda recebe uma graninha por pagar sua dívida com a sociedade, ainda temos as famosas saídas temporárias, vulgarmente conhecidas como “saidinhas” que fazem com que grande número de presos saia da prisão em dias festivos, destes muitos vão para a rua cometer mais crimes e grande parte não volta para a prisão, estes são alguns exemplos entre tantas outras ações que beneficiam quem comete crimes no Brasil.


Ouvimos sempre e reconhece-se, no entanto, que todos têm direito a defesa e que todos são inocentes até que se prove o contrário, até ai, tudo certo. Entramos no errado, na impunidade a no estímulo a criminalidade quando temos pela frente menores assassinos e inimputáveis que nos expõem a desde os pequenos delitos como pichações, passando por roubo, furto, tráfico de entorpecentes, sequestro, enfim, uma infinidade de diferentes condutas antissociais até aos crimes cruéis e impiedosos e muitas vezes sequer são detidos e quando são, recebem apenas medidas sócio-educativas por ser menor.
Percebemos assim, que ao observar-se o limite etário do indivíduo não se dá importância a sua conduta criminosa tampouco ao caráter danoso de suas ações e sua capacidade de entendimento do ato ilícito. Se um indivíduo, independente de sua idade, cor ou condição social é capaz de roubar, estuprar, torturar, abusar de crianças, matar, esquartejar, provocar rebeliões e cometer uma infinidade de barbáries sem ter compaixão do próximo então já passou da hora da lei parar de usar a compaixão e ser fria o suficiente para fazer com que cumpram as penas cabíveis a cada delito cometido.


- Até quando o Direito Penal dará pena mínima e continuará encobrindo criminosos?


- Desafogar os presídios transferindo para a sociedade o caos penitenciário do país através da “lei da impunidade” (lei 12.403/11) que colocará nas ruas cerca de 220.000 detentos libertados em massa é uma forma de aumentar a criminalidade?


A “lei da impunidade” beneficia o criminoso também permitindo a fiança em crimes com pena igual ou inferior a quatro anos, seja de reclusão ou detenção como porte de arma, furto simples e sequestro ficando a prisão reservada somente para crime hediondo.


Nestes casos o ”Estado” ganha com a fiança e deixa de gastar com a prisão mas quem perde mesmo com tudo isto é a sociedade, perde em seu direito de ir, vir e estar em segurança, perde ao saber que todo crime é um crime e não o deixa de ser independente de onde, quando, como, porque aconteceu e há quanto tempo; perde financeiramente, perde ao ver impregnar-se uma cultura violenta de generalizada impunidade, perde por ter que manter o preso com seus impostos sendo que eles deveriam trabalhar obrigatoriamente para manter seus custos.


É a certeza da impunidade que leva os infratores a dar risadas no momento da prisão e a voltar a cometer crimes quando voltam para as ruas. Quando o Brasil quiser realmente combater a criminalidade, deixará de fazer leis que beneficie os criminosos e tomará medidas punitivas, exemplificativas e educativas no combate a criminalidade! 
http://www.jornalpolopaulistano.com.br/editorial_impunidade.html


A impunidade assola nossa sociedade e causa prejuízo a todos, inclusive a determinados políticos, autoridades e teóricos do Direito.

O sentimento no Brasil é o de que as penas, a aplicação das penas, a morosidade da justiça e as leis demasiadamente protetivas ao criminoso estão destruindo nossa sociedade. Não obstante esta constatação - a qual já está demonstrada por enquetes que fazemos neste site - contrariando a Constituição Federal, os responsáveis pela elaboração e aplicação da lei penal e processual penal nada fazem para que o comando constitucional que diz que o poder emana do povo e que os políticos são apenas os representantes da vontade deste povo seja aplicado.

O projeto do novo código de processo penal, por exemplo, em vez de procurar amenizar a morosidade da justiça e diminuir a impunidade, prefere tentar aumentar as garantias dos criminosos, como se as que já existem no Brasil não fossem suficientes. As vítimas estão completamente esquecidas em nosso sistema penal e o projeto do novo código também não procurou dar-lhes dignidade e proteção.

Por parte dos políticos, nota-se o absoluto abandono da segurança pública. Definitivamente, não há investimentos na polícia nem leis que lhe garantam mais independência e efetividade para fazer a prevenção e a investigação dos crimes.

A fim de que seja fortalecido o combate ao crime, à corrupção e à impunidade em nosso país, é necessário que as polícias civil e federal tenham autonomia e independência para realizar as suas funções.

É preciso que se entenda que o criminoso não deve ser preso somente com a condenação. A razão da prisão não é apenas a punição/retribuição pela condenação, mas também a prevenção e tranquilidade social, pois se aquele criminoso permanecer em liberdade durante o inquérito policial ou processo, poderá continuar a praticar os crimes. Em determinadas situações, pelo passado do criminoso e pela forma de vida e atuação nos crimes, já é possível perceber que ele não pode permanecer em liberdade, sob pena de perdermos vidas inocentes e, neste caso, quem se responsabilizará por isso?
A punição ao indivíduo que pratica um ato ilícito não pode ser aplicada apenas aos mais pobres. É necessário que a lei seja aplicada com efetividade para todos, sem distinção de cor, raça, sexo, condição social, origem, religião ou idade.

Ora, é tão evidente e notória a opinião popular, que sinceramente não conseguimos entender a razão pela qual a maioria dos políticos e juristas insistem em contrariá-la.
Por meio deste site, tentaremos entender e explicar tais motivos, bem como mudar a tendência que vigora neste país (no sentido de que o criminoso deve ter cada vez mais liberdade, direitos e garantias e a sociedade cada vez mais presa, com medo e sem direitos e garantias). Aqui abordaremos temas como a maioridade penalcausasnotícias e formas de combate à impunidade no Brasil.

CHEGA! O Brasil não aguenta mais essa situação. 
Equipe Impunidade.com.br   http://www.impunidade.com.br/



Violência e impunidade

Adeildo Nunes
Juiz de Execução Penal-PE

Todos os dados estatísticos fornecidos por institutos de pesquisas de opinião e por organizações estatais e não governamentais elaborados nos últimos anos, com efeito, comprovam as principais causas da violência no Brasil. Nota-se, claramente, que a desumana distribuição de renda, um sistema carcerário que não recupera o condenado, a morosidade da justiça criminal, o uso indiscriminado de armas de fogo por parte da população, a ausência de políticas sociais e de  segurança pública e o despreparo das nossas polícias, são fatores que efetivamente contribuem para  o alarmante crescimento da violência no País. Em resumo, a falta de investimento na área social e a impunidade estão levando o Brasil a atingir índices de criminalidade nunca vistos, aos olhos de todos e de tudo. O IBGE, recentemente, detectou que mais de 40 milhões de brasileiros vivem em estado de pobreza absoluta, pessoas analfabetas e sem nenhuma perspectiva de augurar um trabalho que possibilite sua sobrevivência e da sua família. Com uma das piores distribuição de renda do planeta, pode-se afirmar que os poucos ricos brasileiros não têm interesse algum em dividir sua riqueza com os mais pobres, maioria absoluta. Como conseqüência dessa péssima distribuição de renda,  a fome e a criminalidade assumem características inusitadas, apavoram a sociedade e as nossas poucas autoridades públicas que preocupam-se com essa triste realidade social. A miséria, portanto, é a causa primeira dessa violência desenfreada. Sabendo-se que embora tenhamos uma das maiores população carcerária do mundo – perdemos em quantidade apenas para os Estados Unidos e Índia – pouco tem sido feito no sentido de atenuar os graves problemas que envolvem o sistema penitenciário nacional. A realidade prisional brasileira todos sabemos: facções criminosas poderosas convivendo com autoridades públicas dentro dos presídios, costumeiramente planejando crimes, rebeliões e fugas espetaculares, farta comercialização de armas e entorpecentes, uso indiscriminado de aparelhos celulares por parte de detentos e acentuada prostituição adulta e infantil. Recuperar o condenado, nem de longe estamos conseguindo. O fraco desempenho do sistema prisional, assim, é outro grave fator que alimenta a violência, porque a prisão é um castigo, não um meio de ressocializar o criminoso. A ausência de políticas sociais que ofereçam ao homem e à mulher o mínimo de dignidade possível (emprego, saúde, educação, moradia e segurança pública), é claro que também contribui para o aumento da criminalidade. Ao lado de uma ilicitude assustadora e à cada dia crescente, nossas polícias encarregadas pela investigação criminal estão sucateadas, despreparadas e desaparelhadas para realizar importante missão. Dados oficiais informam que de cem homicídios que são praticados no Recife, só oito deles chega-se à autoria e apenas três transformam-se em ação penal, significando dizer que a impunidade é generalizada para um tipo de crime tão grave. Não havendo uma boa investigação criminal, não há que se falar em justiça, porque a ação penal dependerá sempre de um inquérito policial bem realizado. Mesmo com o fraco desempenho policial, as Varas criminais do País estão superlotadas de processos aguardando julgamento. Se o réu não é localizado – o que acontece com freqüência – o juiz, em geral, decreta a sua prisão e o processo fica aguardando que este acusado seja preso. São trezentos mil mandados de prisão sem o devido cumprimento. Enquanto o réu não for preso, o processo permanece estagnado. É a lei que assim determina, mas isso tem dado causa à impunidade.
Afora este fato, é bom lembrar que o nosso Código de Processo Penal é de 1941 e de há muito necessita de uma reforma no sentido de diminuir o número de possibilidades recursais que tanto procrastinam o andamento do processo. Em outras palavras, temos uma justiça criminal lenta e que precisa ser aprimorada, porque sua morosidade tem dado causa ao aumento da criminalidade e da impunidade. Para cada cem homicídios praticados no Brasil, noventa são concretizados com o uso de armas de fogo. Crime afiançável, o porte ilegal de armas não é contido, mas é causa da morte de muitas pessoas. É necessário proibir sua comercialização e a sua utilização deve ser   privativa da força policial. Com políticas sociais voltadas para todos, um novo modelo de investigação criminal e processual penal, um fim na comercialização da arma de fogo, um sistema carcerário que recupere o criminoso e a punição de todos que violem a lei penal, tenham certeza, diminuiremos a violência e a criminalidade.



A justiça da impunidade

Ineficiência da polícia e do Judiciário quebra crença nas instituições democráticas



CARLOS HAAG | Edição 209 - Julho de 2013

© DIRCEU PORTUGAL /AE
Policiais revistam as celas da cadeia de Cianorte, Paraná, após fuga de presos

Policiais revistam as celas da cadeia de Cianorte, Paraná, após fuga de presos
Uma frase de 1764 que consta do clássico Dos delitos e das penas, de Cesare Beccaria, tem uma atualidade notável: “A perspectiva de um castigo moderado, mas inevitável, causará sempre uma impressão mais forte do que o vago temor de um suplício terrível, em relação ao qual se apresenta alguma esperança de impunidade”. Sua antevisão também captou tendências em voga. “Há no Brasil a sensação forte de que, independentemente de classe, riqueza ou poder, os crimes cresceram e se tornaram mais violentos, porém há impunidade. Nesses momentos as pessoas acham que a solução são leis mais severas e mais tempo de prisão”, diz o sociólogo Sérgio Adorno, coordenador do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, um dos 17 Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão financiados pela FAPESP (NEV-Cepid/USP).
“O sentimento de impunidade gera descrença nas instituições democráticas encarregadas de aplicar a lei e a ordem, proteger os direitos civis dos cidadãos, consagrados na Constituição, em especial o direito à segurança”, fala o pesquisador. Mas qual seria a real dimensão dessa impunidade? Com essa preocupação foi feita a pesquisa Inquérito policial e processo judicial em São Paulo: o caso dos homicídios, um desdobramento do projeto Estudo da impunidade penal. A proposta era analisar o fluxo de ocorrências de homicídios desde o registro policial até a sentença judicial. O que se pretendia era, além de medir a impunidade penal, identificar os fatores judiciais e extrajudiciais, bem como os mecanismos institucionais que favorecem a desistência da aplicação de penas para estes crimes.
Os números básicos já revelam a magnitude da impunidade: apenas 60,13% das ocorrências de homicídios foram objeto de investigação. Logo, para cerca de 40% dos registros não foram identificados inquéritos policiais. Enquanto os homicídios cresceram 15,51%, os inquéritos policiais aumentaram apenas 7,48%. “Isso significa que aumentou o hiato entre o potencial de crescimento da violência e a capacidade de as autoridades policiais investigarem crimes, o que pode ter repercutido na desconfiança dos moradores nas instituições encarregadas de assegurar a ordem pública e aplicar lei e ordem”, observa o sociólogo.
O dado mais notável é sobre a natureza da autoria dos crimes. Apenas 19,58% dos registros de homicídios são de autoria conhecida: a grande maioria, 76,65%, é de autoria desconhecida. No entanto, 90,36% das ocorrências convertidas em inquérito são de homicídios com autoria conhecida. “Em síntese, todo registro deveria virar investigação, mas há uma seletividade patente centrada nos 10% de conhecidos, ou seja, aqueles cometidos por vizinhos, parentes, colegas de trabalho, amigos de bar etc. Se há flagrante, esse número cresce para 97,64%. A natureza da autoria é um critério de seletividade arraigado na cultura da polícia”, fala Adorno. Se há, por exemplo, suspeita de que existe qualquer relação com tráfico de drogas, cresce ainda mais o risco de o crime não ser investigado. “Os policiais dizem que é muito complexo mexer com isso ou que há um grupo especial para esses casos”, conta o pesquisador. Logo, há um percentual pequeno de homicídios investigados e, veremos, uma condenação quase irrelevante nesses casos. Apenas com flagrante é que as possibilidades aumentam.
© EDUARDO NICOLAU / AE
Blitz realizada pela Polícia Militar na avenida Rio Branco, região central de São Paulo, em 2006
Blitz realizada pela Polícia Militar na avenida

Rio Branco, região central de São Paulo, em 2006
“O detalhe é que o flagrante é feito pela Polícia Militar, mas quem se encarrega de fazer a investigação é a Polícia Civil. Então temos um flagrante que é aleatório e que vai ser investigado depois por outro grupo. O sistema funciona de maneira frágil e irracional”, diz Adorno. O sociólogo lembra ainda que diante da ausência de um padrão investigativo entre as delegacias, a seletividade é ainda mais arbitrária do que se imagina. “A pesquisa identificou sete grupos de desempenho, variando desde aqueles com baixo registro de homicídios e baixa produção de inquéritos abertos para investigação até aqueles com elevado volume desses registros e elevada produção de inquéritos.” A investigação policial não parece ser uma prioridade de política institucional da área de segurança pública.
“Não se deve confundir o modelo de inquérito policial existente no país com a mera investigação policial, porque aqui se reúnem atribuições próprias à polícia e atribuições que em outros países são feitas com o controle do Ministério Público”, avisa o sociólogo Michel Misse, professor do Departamento de Sociologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e autor de Inquérito policial no Brasil: uma pesquisa empírica (2010). Segundo o professor, com isso, o inquérito brasileiro passa a ser um importante dispositivo de poder nas mãos dos delegados de polícia, uma peça que tende a prevalecer durante todo o processo legal de incriminação. “É o núcleo mais reticente e problemático de resistência à modernização do sistema de justiça brasileiro. Por isso virou também uma peça insubstituível, a chave que abre todas as portas do processo e que poupa trabalho dos demais operadores do processo, os promotores e juízes”, avisa. Para Misse, ele se transforma num dispositivo de seletividade na esfera policial: instaurá-lo ou não pode transformá-lo numa “mercadoria política”.
“Se o modelo do inquérito policial adotado no Brasil contribui para a baixa capacidade de resolução judicial dos conflitos e crimes, é certo que também funciona adequadamente para preservar e reproduzir um ‘sistema-arquipélago’ em que saberes concorrentes não se entendem bem”, avalia Misse. O inquérito, segundo o pesquisador, percorre esse arquipélago e dá a ele a aparência de um continente, embora os resultados obtidos sejam nulos e a “degola”, a sujeição criminal extrajudicial, muitas vezes seja a demanda e a solução daqueles que, por não confiarem mais na justiça do Estado, vão em busca da justiça pelas próprias mãos.
© CAROL CARQUEJEIRO/FOLHAPRESS
Detento do presídio modular da delegacia do bairro de Novo Horizonte, município de Serra, ES, em 2006

Detento do presídio modular da delegacia do bairro de Novo Horizonte, município de Serra, ES, em 2006
Para a socióloga Joana Domingues Vargas, professora do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), autora da pesquisaControle e cerimônia: o inquérito policial em um sistema criminal frouxamente ajustado, o modelo policial atual só se mantém porque os delegados ainda se aferram a velhos instrumentos de inquérito e têm um lobby forte no Congresso para essa permanência. “Há mais de 10 anos tramitam propostas de simplificação e modernização da investigação criminal e outros tópicos semelhantes, sem resultados. O aumento da criminalidade violenta nos últimos 30 anos diminuiu ainda mais a efetividade do sistema de justiça criminal”, nota Joana. São novas modalidades de crimes, um volume crescente de inquéritos policiais e a morosidade crescente no processamento desses que só levam à perda de legitimidade do sistema. “Temos apenas que imaginar a dificuldade que representa a transformação ou a eliminação de instrumentos que reproduzem a ordem social do Brasil, que tem como uma de suas marcas centrais a distância entre os dispositivos previstos na lei pelo Estado e as práticas efetivas que recaem sobre a sociedade, tendo como resultado a desconfiança geral sobre essas práticas.”
O antropólogo Luiz Eduardo Soares, ex-secretário de Segurança do Rio de Janeiro e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), autor de Violência política no Rio de Janeiro (1996), observa que, com seus 50 mil homicídios dolosos por ano, o Brasil fica em quinto lugar na América Latina. “Desse total, porém, só 8% são esclarecidos, ainda que não sejam julgados na Justiça, ficando impunes 92%. Isso quer dizer que somos o país da impunidade? Sim e não. Porque temos 540 mil presos, a terceira população carcerária do mundo e a taxa mais veloz de encarceramento do planeta”, analisa. Como explicar essa contradição? “Mais de 65% dos presos, nos últimos quatro anos, são jovens pobres, negros, que não usavam armas, não tinham vínculos com organizações criminosas e foram presos em flagrante por negociarem substâncias ilícitas”, explica o antropólogo, que critica o sistema que prende sem dar condições de retorno dos jovens à vida.
Para Adorno, “em resumo, está na fase policial o maior gargalo para que réus, suspeitos de haverem cometido um homicídio, possam ser processados e julgados de acordo com o devido processo legal”. E quando passamos para a segunda fase, o sistema de justiça, atingimos outro funil. “É praticamente impossível pesquisar no Judiciário brasileiro, porque gastamos anos em busca de pastas de processo sem localizá-las, entre outros problemas. Mas, do que encontramos, verificamos que apenas um terço dos infratores foi sentenciado pelo crime de homicídio, tendo os demais destinos o arquivamento do inquérito, impronúncia, absolvição sumária e absolvição”, conta o sociólogo. Ao contrário do que diz a literatura especializada, as fases judiciais são igualmente sujeitas à destacada seletividade, ainda que mais restritas aos controles processuais penais.
© BRUNO MIRANDA / FOLHAPRESS
Funcionário trabalha, entre as pilhas de autos processuais, em um dos cartórios do Tribunal de Justiça de São Paulo
Funcionário trabalha, entre as pilhas de autos

processuais, em um dos cartórios do Tribunal de Justiça de São Paulo
Novamente, a não investigação dos casos de autoria desconhecida é o fator central da impunidade: o não esclarecimento foi responsável pelo desfecho de 84,5% dos inquéritos arquivados. A tudo isso se junta uma morosidade penal: esses inquéritos arquivados levaram em média 25,8 meses para serem encerrados. Nos casos em que houve denúncia a fase policial foi concluída em 4,3 meses. Maior o tempo gasto na etapa inicial dos procedimentos policiais, menor a possibilidade de investigação. “O notável é que fatores extralegais ligados às características biográficas de réus/acusados, como cor, não parecem influenciar as taxas de impunidade. O perfil dos indiciados/réus é muito semelhante entre impronunciados, absolvidos sumariamente, arquivados, comparativamente aos denunciados e aos que foram a júri. As razões para isso não são claras. Em tese, essa descoberta significa dizer que preconceitos e julgamentos valorativos dos operadores técnicos do direito não influenciam as decisões judiciais ou a sentença judicial. Mas na análise qualitativa foi frequente flagrar preconceitos e julgamentos valorativos nos argumentos usados pela acusação e pela defesa”, observa Adorno.
“As provas técnicas constantemente estão sujeitas a erros e na maioria dos casos tudo está centrado em evidências e testemunhos orais, embora prevaleça, nos documentos, a lei do silêncio, bem como ao longo de um processo, que chega a durar até cinco anos, muitas testemunhas não são mais encontradas, o que acentua a produção de provas inconsistentes”, fala o pesquisador. Não existe tampouco a previsibilidade esperada em sistemas de justiça que funcionam. “É muito comum se flagrarem retratos morais dos envolvidos, algo de natureza extrajudicial, usados pela defesa e pela acusação, tentando influenciar decisões e sentenças. Também é comum a inversão do ônus da prova: pela lei brasileira, cabe ao Estado provar a culpa dos réus reunindo material sólido comprobatório. Muitas vezes, se atribui ao réu o ônus de provar sua inocência, mas ele não tem os mesmos recursos do Estado.”

Para o sociólogo ficou difícil saber se a crença nas instituições de segurança foi abalada, já que, diz, as crenças em todas as instituições parecem quebradas. “Por isso, no centro da segurança deve estar como objetivo a redução da impunidade. Isso não passa pelo aumento do rigor de punir os criminosos, como em geral as pessoas querem, mas no aumento da certeza dessa punição. Não há necessidade de penas mais duras ou mesmo da ampliação da tipologia dos crimes hediondos. Devemos aumentar as chances de um indivíduo que tenha cometido um ato criminoso ser identificado, preso, processado e sentenciado. Condenado, ele deve realmente ir para o sistema prisional”, analisa o sociólogo Flavio Sapori, do Centro de Estudos e Pesquisa em Segurança Pública da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (Cepesp-PUC Minas), autor deSegurança pública no Brasil: desafios e perspectivas (2007).

Para o pesquisador, a impunidade é a grande fragilidade do sistema de justiça criminal na sociedade brasileira. “Os alvos aumentaram, bem como a disponibilidade das armas de fogo, mas a capacidade preventiva do sistema não acompanhou essa elevação. Os níveis de impunidade, se não cresceram, permaneceram os mesmos, em patamares elevados. Impunidade entendida como baixo grau de certeza de punição e não propriamente baixa severidade da punição”, observa Sapori. Daí a continuidade nos pedidos de maior rigidez e penas, como o debate sobre o rebaixamento da maioridade penal.
“Cada sociedade tem que decidir o que são seus jovens, se quem está apto a dirigir pode ou não ir para uma prisão, mas há muitos equívocos a serem desfeitos antes de uma decisão”, fala Adorno. Um deles é o suposto crescimento da criminalidade dos menores. “O que há, na verdade, é um decréscimo. Aumentou, sim, a crueldade nos crimes cometidos pelos jovens, um fator que precisa ser investigado.” Outro ponto é: para qual prisão serão levados esses adolescentes? “Hoje o PCC domina as prisões e o comportamento dos presos em detalhes. Até mesmo os presos homossexuais são discriminados lá dentro. Quanto mais prisões o governo constrói, mais o PCC lucra com as pensões, vendinhas e o comércio interno e no entorno dessas cadeias. Não basta jogar na cadeia sem pensar como ele vai sair em alguns anos, um ‘soldado’ treinado pelo PCC”, avisa Adorno.
Para o pesquisador, mudou a natureza do crime, mas se insiste em oferecer as mesmas respostas, sem levar em conta que há uma nova “economia do crime” que opera em coletivos organizados sob a forma de rede, cuja resposta não se dá apenas pelo desejo obsessivo de lei e ordem punitiva com mais prisões. “Nem a Justiça, nem as pessoas estão preparadas para esse tipo de crime. Não se trata mais apenas da questão da arbitrariedade, que deve ser combatida, é claro, mas do que funciona ou não para dar a segurança ao cidadão”, fala o pesquisador.

Em PCC: hegemonia nas prisões e monopólio da violência, lançado no mês passado, a socióloga Camila Nunes Dias, da Universidade Federal do ABC, fruto de seu doutorado, orientado por Adorno, mostra que, no estado de São Paulo, 90% das prisões, num total de 200 mil presos, são controladas pela facção criminosa. Mas o comando está em processo de nacionalização com braços em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, Paraná, Sergipe e Pernambuco. O detalhe importante é que o PCC cresce em paralelo com o aumento da violência, das prisões e, acima de tudo, da impunidade. “Há uma queda notável na taxa de homicídios do estado a partir dos anos 2000, um movimento que começa em 2001 e se acentua a partir de 2005, quando o PCC se expande para além das prisões, se estabelecendo em bairros da periferia, uma verdadeira hegemonia fora do sistema prisional”, explica Camila.

Para a pesquisadora, uma queda de 80% na taxa de homicídios não se explicaria apenas por fatores como a expansão do sistema prisional ou aumento da presença de ONGs na periferia, fatores comumente mobilizados para explicar esse fenômeno. “No momento em que o PCC passa a mediar e regular disputas no mundo do crime, em especial no mercado de drogas, o processo de vingança e violência anárquico de antes passa a ser controlado pelo PCC”, nota. O PCC se transforma na instância de mediação que rompe os ciclos de vingança. O mesmo se daria dentro das prisões, onde cada vez menos há rebeliões, o que não significa melhorias das condições de vida, mas da manutenção da ordem para evitar problemas com o Estado, prova da hegemonia do PCC, razão pela qual não se ouve mais falar em rebeliões.
“O mundo do crime teve a capacidade de implementar um dispositivo capaz de oferecer parâmetros de comportamento e de estabelecer operadores de fiscalização e instâncias, experimentadas como legítimas, para julgar e punir os desvios e os desviantes”, analisa Camila. Tudo, é claro, em nome do poder, dos negócios e de uma ideologia de oposição ao Estado. O esforço em bloquear a lógica dos “mata-mata”, que assolaram a periferia durante a década de 1990, a interrupção das cadeias de vingança privadas, motivos da maioria dos homicídios, é um dos significados mais importantes do sentido de justiça implícitos nos debates promovidos para solucionar os conflitos interpessoais no âmbito do poder do PCC, afetando diretamente a queda das taxas de homicídios em São Paulo.
Claro que a ordem social pela imposição da paz pelo PCC tem como reverso as zonas de exclusão, nas quais estão os “párias” que não cabem na unidade constituída pela consolidação do poder, nota Camila. Ao mesmo tempo, não se sabe por quanto tempo e em que condições vai durar essa “paz”, totalmente nas mãos dos criminosos. “A percepção da ineficiência das agências estatais na promoção da democracia, por causa da impunidade penal, tem estimulado a adoção de soluções privadas, extremamente violentas, que contribuem para aumentar os sentimentos de insegurança coletiva e a emergência de um poder capaz de controlar, de forma espúria, autoritária e criminosa, os conflitos”, diz Adorno.     http://revistapesquisa.fapesp.br/2013/07/12/a-justica-da-impunidade/


Esteja certo: aumente a construção de unidades prisionais, evolua o código penal, divulgue o aumento de recolhimento dos meliantes às celas, Brasil (comece a pensar seriamente em oferecer laqueaduras a baixo custo às mulheres, analise a necessidade de um controle de natalidade eficiente - não falo de aborto, pois sou contra,  e teremos resultado!). 
Serena (SCS)




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